Produto com defeito comprado em marketplace: quem é o responsável?

Produto com defeito comprado em marketplace: quem é o responsável?

Comprar online se tornou parte integrante de nossas vidas, não é mesmo? A comodidade de adquirir produtos de diversos vendedores em um único lugar, como em marketplaces gigantes como Mercado Livre, Amazon ou Magazine Luiza, é inegável. No entanto, o que fazer quando a empolgação da nova compra se transforma em frustração porque o produto chegou com defeito? A pergunta que surge imediatamente é: quem é o responsável por esse problema?

Essa é uma dúvida comum e extremamente relevante para o consumidor brasileiro, que muitas vezes se sente desamparado diante de uma situação assim. Para esclarecer de vez essa questão e guiar você pelos seus direitos, preparei este artigo detalhado.

A Complexa Relação no Marketplace: Vendedor, Plataforma e Consumidor

Antes de mergulharmos nas responsabilidades, é fundamental entender a dinâmica de um marketplace. Ele funciona como uma “vitrine virtual” onde diversos lojistas (os vendedores) expõem seus produtos para um público vasto. A plataforma (o marketplace em si) atua como intermediária, facilitando a transação, o pagamento e, em alguns casos, até a logística de entrega.

É justamente essa relação tripartite – consumidor, vendedor e plataforma – que gera a complexidade na hora de determinar quem deve responder pelo produto com defeito. O Código de Defesa do Consumidor (CDC) é a nossa bússola nessa jornada, e ele estabelece regras claras para proteger o consumidor.

Responsabilidade Solidária: O Alicerce da Proteção ao Consumidor

A boa notícia para o consumidor é que, na maioria dos casos de produto com defeito comprado em marketplace, a responsabilidade é solidária. Mas o que isso significa na prática? Significa que tanto o vendedor (fornecedor direto do produto) quanto o marketplace (a plataforma que intermediou a venda) podem ser acionados para resolver o problema.

Essa solidariedade está prevista no artigo 7º, parágrafo único, e no artigo 25, parágrafo 1º, do Código de Defesa do Consumidor. A lógica por trás disso é simples: o CDC entende que todos os envolvidos na cadeia de consumo que se beneficiam daquela relação devem ser responsabilizados por eventuais vícios ou defeitos.

Quando o Vendedor é o Principal Responsável?

Em primeiro lugar, o vendedor do produto é sempre o fornecedor direto e, portanto, o responsável primário por garantir a qualidade e a adequação do que vende. Se o produto apresentar um defeito de fabricação, um vício de qualidade ou simplesmente não funcionar como deveria, a primeira pessoa a ser contatada é o vendedor.

Ele tem o dever de:

  • Oferecer a troca do produto por um novo e sem defeitos.
  • Realizar o reparo do produto, se for o caso e se o defeito for sanável.
  • Devolver o valor pago pelo produto, caso a troca ou o reparo não sejam possíveis ou não resolvam o problema.

É importante lembrar que o prazo para o consumidor reclamar de vícios aparentes ou de fácil constatação é de 30 dias para produtos não duráveis e 90 dias para produtos duráveis, contados a partir da entrega do produto. Para vícios ocultos (aqueles que só aparecem com o uso), o prazo começa a contar a partir do momento em que o defeito é detectado.

Quando o Marketplace Compartilha a Responsabilidade?

Aqui é onde a questão se torna mais interessante e, para muitos, menos óbvia. O marketplace pode e deve ser responsabilizado, de forma solidária, em diversas situações. Ele não é apenas um “muro” ou um “classificado”; ele oferece uma estrutura, garante um ambiente de transação e, muitas vezes, atua ativamente na logística e no pós-venda.

A responsabilidade do marketplace surge em casos como:

  1. Falha na Prestação de Serviço: Se o problema decorre de uma falha no serviço prestado pelo próprio marketplace, como um erro no processamento do pagamento, um problema na entrega (se a logística for deles) ou uma falha na comunicação com o vendedor.
  2. Má Escolha ou Fiscalização dos Vendedores: Embora os marketplaces se defendam dizendo que apenas intermediam, o CDC entende que eles têm um dever de cuidado na seleção dos vendedores que atuam em sua plataforma. Se um vendedor age de má-fé, aplica golpes ou vende produtos recorrentemente com defeito, o marketplace pode ser responsabilizado por permitir que esse vendedor continue operando em sua plataforma.
  3. Participação Ativa na Transação: Quando o marketplace atua de forma mais robusta na transação, por exemplo, oferecendo o serviço de fulfillment (armazenamento e envio dos produtos), ele se aproxima da figura do fornecedor e, consequentemente, sua responsabilidade aumenta.
  4. Ausência de Informações Claras: Se o marketplace não oferece canais claros e eficientes para o consumidor resolver seus problemas, dificultando o contato com o vendedor ou a resolução da questão, ele também pode ser responsabilizado por essa omissão.
  5. Ofertas Enganosas ou Abusivas: Se o marketplace veicula publicidade enganosa ou abusiva por parte de um de seus vendedores, ele também pode ser corresponsável.

O Que Fazer em Caso de Produto com Defeito? Um Guia Prático

Diante de um produto com defeito comprado em marketplace, siga este passo a passo para garantir seus direitos:

  1. Documente Tudo: Tire fotos ou grave vídeos do produto e do defeito. Guarde todas as conversas com o vendedor e o marketplace (e-mails, prints de chat, etc.), notas fiscais, comprovantes de pagamento e rastreio. Essa documentação será crucial.
  2. Contate o Vendedor Primeiro: Inicie a comunicação com o vendedor por meio dos canais disponibilizados pelo marketplace. Explique o problema e solicite a solução (troca, reparo ou devolução do dinheiro).
  3. Acione o Marketplace: Se o vendedor não responder, se a resposta não for satisfatória ou se você sentir que está sendo enrolado, acione o marketplace. Utilize os canais de atendimento ao cliente da plataforma para registrar sua reclamação. Muitos marketplaces possuem programas de proteção ao comprador que podem ser acionados nessa fase.
  4. Recorra aos Órgãos de Defesa do Consumidor: Se, ainda assim, o problema persistir e você não conseguir uma solução amigável, procure o Procon da sua cidade ou utilize plataformas como o Consumidor.gov.br. Esses órgãos são mediadores e podem ajudar a pressionar o vendedor e o marketplace a resolverem a questão.
  5. Ação Judicial: Em último caso, se todas as tentativas extrajudiciais falharem, considere entrar com uma ação judicial no Juizado Especial Cível (Pequenas Causas), que é mais rápido e não exige advogado para causas de até 20 salários mínimos. Para valores acima disso, a presença de um advogado é obrigatória.

Não Haja de Cabeça Quente: A Importância da Calma e da Persistência

É compreensível que a frustração tome conta quando um produto com defeito aparece. No entanto, agir de forma impulsiva pode prejudicar sua capacidade de resolver o problema. Mantenha a calma, siga os passos acima e seja persistente. Seus direitos estão garantidos pelo Código de Defesa do Consumidor, e as empresas (tanto vendedores quanto marketplaces) têm a obrigação de respeitá-los.

Lembre-se: o direito do consumidor é um campo vasto e complexo. Se você se sentir perdido ou se o problema for muito complexo, buscar a orientação de um advogado especialista em direito do consumidor pode ser o diferencial para garantir seus direitos.

Priscila Casimiro Ribeiro Garcia

Advogada altamente qualificada, Pós Graduada em Execuções Cíveis pela OAB/SP. Especialista em Direito de Família, atuante na área há mais de 15 anos.

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