A obrigação de pagar pensão alimentícia, um tema já complexo por si só, ganha novas camadas de discussão quando envolve a figura dos avós. A lei brasileira, tradicionalmente, atribui esse dever aos pais, mas o que acontece quando eles não conseguem cumprir a responsabilidade? E, mais importante, o que a Justiça entende sobre os avós socioafetivos?
Com o avanço das discussões sobre família, o conceito de parentesco socioafetivo ganhou força, sendo reconhecido pelo ordenamento jurídico. A pergunta que se coloca, portanto, é: se o amor e o cuidado construíram uma relação de avós e netos, essa relação pode também gerar a obrigação de prestar alimentos?
Neste artigo, vamos aprofundar nesse assunto, explorando o que diz a legislação, como a Justiça tem se posicionado e em quais situações os avós, sejam eles biológicos ou socioafetivos, podem ser chamados a assumir a responsabilidade financeira pelos netos.
A responsabilidade dos avós biológicos
Primeiro, é fundamental entender o que já está estabelecido na lei sobre a pensão avoenga. O Código Civil brasileiro, no artigo 1.696, prevê a possibilidade de a obrigação de pagar alimentos ser estendida aos avós em caráter subsidiário e complementar.
Isso significa que, antes de acionar os avós, o juiz deve esgotar todas as possibilidades de cobrança da pensão dos pais biológicos. É necessário comprovar que os pais não têm condições financeiras de arcar com o valor total da pensão ou que o valor que eles podem pagar é insuficiente para suprir as necessidades do menor.
Ou seja, os avós biológicos só são chamados a contribuir quando a obrigação parental falha. Em outras palavras, a pensão dos avós não é uma substituição, mas sim um auxílio, um complemento à pensão dos pais.
A nova discussão: Avós socioafetivos
Com o reconhecimento da multiparentalidade e do parentesco socioafetivo, o debate se estendeu. A afetividade, que antes era vista apenas como um laço emocional, passou a ter peso jurídico, criando direitos e deveres. Por isso, a pergunta central deste artigo: os avós socioafetivos também podem ser responsabilizados pelo pagamento de alimentos?
A resposta para essa questão ainda está em construção nos tribunais, mas a tendência é que sim, eles podem. A premissa é simples: se a lei e a sociedade reconhecem o vínculo afetivo como uma relação de parentesco, os deveres que decorrem desse laço devem ser os mesmos que se aplicam ao parentesco biológico.
Portanto, se um avô ou avó estabeleceu uma relação de afeto e cuidado com o neto, assumindo-se socialmente como tal, é possível que a Justiça entenda que essa pessoa também tem o dever de prestar auxílio financeiro, caso o pai ou a mãe socioafetivos não possam fazê-lo.
O que configura um vínculo socioafetivo para fins de pensão?
Para que o juiz reconheça o vínculo e, consequentemente, a obrigação de prestar alimentos, é necessário que a relação de afeto seja comprovada. Essa não é uma tarefa simples, pois não basta apenas a intenção ou a convivência esporádica.
O que a Justiça geralmente busca são provas de que o avô ou a avó socioafetivo(a) exerceu o papel de avô(ó) na vida do neto de forma contínua e pública. Algumas evidências que podem ser apresentadas incluem:
- Tratamento de “avô” ou “avó”: Provas de que a criança se refere a essa pessoa como avô ou avó.
- Convivência regular e afetiva: Fotos, vídeos, depoimentos de vizinhos e amigos que mostrem a rotina e o vínculo.
- Participação na vida da criança: Participação em eventos escolares, festas de aniversário e outras atividades importantes.
- Assunção pública do papel: O avô ou avó socioafetivo(a) deve ter se apresentado à sociedade como avô ou avó da criança, sem esconder ou negar o vínculo.
É importante ressaltar que o simples fato de uma pessoa conviver com o neto do(a) companheiro(a) não a torna, automaticamente, um avô ou avó socioafetivo(a). A obrigação só será imposta se houver a exteriorização desse vínculo e o reconhecimento social da relação.
Procedimento para acionar avós socioafetivos
O processo para acionar avós socioafetivos é o mesmo que se aplica aos avós biológicos, com um passo extra: a necessidade de provar a existência do vínculo socioafetivo. A ação de alimentos contra os avós é movida por quem detém a guarda da criança, geralmente o pai ou a mãe.
Na ação, o autor deve demonstrar:
- A necessidade do menor: Provas dos gastos com alimentação, educação, saúde, etc.
- A impossibilidade de o pai ou a mãe arcar com a pensão: Apresentar provas de desemprego, baixa renda, doença ou qualquer outro motivo que justifique a incapacidade de pagamento.
- A capacidade financeira dos avós: Demonstrar que eles têm condições de contribuir para o sustento do neto.
- A existência do vínculo socioafetivo: Apresentar as provas mencionadas no tópico anterior, como fotos, testemunhas e documentos que comprovem a relação.
A ação de alimentos avoengos, como é chamada, é um recurso extremo, utilizado quando todas as outras alternativas se esgotaram. A decisão judicial levará em conta não apenas a necessidade da criança, mas também a capacidade de pagamento dos avós e a comprovação robusta do parentesco socioafetivo.
A responsabilidade de pagar pensão alimentícia é, em primeira instância, dos pais. Contudo, a legislação e a jurisprudência evoluíram para reconhecer que, em casos de necessidade, os avós também podem ser chamados a auxiliar.
Com o reconhecimento do parentesco socioafetivo, o dever de sustento pode ser estendido não apenas aos avós biológicos, mas também àqueles que, por meio do afeto e do convívio, construíram um laço familiar com o neto. É um avanço na proteção dos direitos da criança, garantindo que o seu bem-estar seja sempre a prioridade.
Se você está em uma situação como essa, seja buscando a pensão para seu filho ou sendo acionado como avô, é fundamental buscar a orientação de um advogado especialista em direito de família. Um profissional capacitado poderá analisar o seu caso, orientar sobre a documentação necessária e defender seus direitos da melhor forma possível, garantindo que a justiça seja feita.