Bloqueio de Conta Bancária para Cobrar Pensão: Como Funciona o Processo e Quais os Seus Direitos

Um advogado em um escritório formal aponta para um documento enquanto explica a um cliente preocupado o funcionamento do bloqueio judicial de conta bancária por dívida de pensão alimentícia.

O não pagamento da pensão alimentícia é uma realidade dolorosa e, infelizmente, comum no Brasil. Para quem depende desses valores, a inadimplência representa mais do que um problema financeiro; é uma ameaça direta ao sustento e bem-estar, especialmente de crianças e adolescentes. Diante desse cenário, o sistema judiciário brasileiro desenvolveu mecanismos cada vez mais eficazes para garantir o cumprimento dessa obrigação, e o mais conhecido deles é o bloqueio de conta bancária.

Muitos devedores são pegos de surpresa quando tentam realizar uma transação simples e se deparam com o saldo indisponível. Esse é o resultado de uma ação judicial que visa assegurar o pagamento forçado do débito alimentar. Mas, como exatamente isso acontece? Quais são os passos legais? E, tanto para quem cobra quanto para quem deve, quais são os direitos e os limites dessa medida?

Este artigo completo foi elaborado para esclarecer, de forma definitiva, todo o procedimento por trás do bloqueio judicial de contas para a cobrança de pensão alimentícia. Continue a leitura para entender o passo a passo, as ferramentas utilizadas pela Justiça e o que fazer em cada situação.

A Dívida de Pensão e o Início do Processo de Execução

Antes de qualquer bloqueio, é preciso que a dívida de pensão alimentícia seja formalizada perante a Justiça. A obrigação de pagar a pensão nasce de uma decisão judicial ou de um acordo homologado em juízo. Quando o devedor, sem justificativa legal, deixa de cumprir com os pagamentos, o credor (geralmente representado pela mãe ou pai que detém a guarda do menor) pode ingressar com uma Ação de Execução de Alimentos.

É neste ponto que o advogado do credor solicita ao juiz as medidas necessárias para forçar o pagamento. O devedor será intimado para, em um curto prazo (geralmente 3 dias), pagar o débito, provar que já o fez ou justificar a impossibilidade absoluta de fazê-lo.

Se o pagamento não ocorrer e a justificativa não for aceita, o juiz determinará as chamadas medidas coercitivas. Embora a prisão civil seja a mais famosa, o bloqueio de ativos financeiros é, sem dúvida, a mais eficiente e a primeira a ser tentada.

O Papel do SISBAJUD: A Tecnologia a Serviço da Justiça

Antigamente, para efetivar um bloqueio, o juiz precisava expedir ofícios em papel para cada banco onde o devedor pudesse ter conta, um processo lento e ineficaz. Hoje, o cenário é completamente diferente graças ao SISBAJUD (Sistema de Busca de Ativos do Poder Judiciário).

Este sistema, que interliga o Judiciário ao Banco Central e a todas as instituições financeiras do país, funciona de maneira quase instantânea. Veja o passo a passo:

  1. Ordem Judicial: O advogado do credor peticiona no processo, solicitando a busca e o bloqueio de valores. O juiz, concordando com o pedido, emite uma ordem eletrônica diretamente no sistema.
  2. Busca Abrangente: O SISBAJUD realiza uma varredura completa em todas as contas e investimentos vinculados ao CPF ou CNPJ do devedor. Isso inclui contas correntes, contas poupança, investimentos em renda fixa, ações e até mesmo saldos em corretoras de criptomoedas que sejam regulamentadas.
  3. Bloqueio Imediato (Indisponibilidade): Ao encontrar valores, o sistema os bloqueia imediatamente. É importante destacar que, neste primeiro momento, o valor fica apenas indisponível na conta do devedor. Ele não é transferido automaticamente para o credor.

Essa agilidade impede que o devedor, ao ser notificado da execução, esvazie suas contas para frustrar o pagamento da dívida.

A Ferramenta “Teimosinha”: A Persistência do Sistema

Uma das evoluções mais significativas do SISBAJUD é a funcionalidade popularmente conhecida como “teimosinha”. Antes dela, a ordem de bloqueio era cumprida uma única vez, em um único dia. Se não houvesse saldo naquele momento, a tentativa era frustrada.

Com a “teimosinha”, o juiz pode programar a ordem de bloqueio para que ela se repita automaticamente por um período, geralmente por 30 dias. Isso significa que o sistema continuará “teimando” e buscando ativos nas contas do devedor diariamente. Se qualquer valor entrar na conta durante esse período (como o pagamento de um salário, um aluguel recebido, etc.), ele será imediatamente bloqueado, aumentando drasticamente a efetividade da cobrança.

Valores que Podem e Não Podem ser Bloqueados

Apesar da eficácia do sistema, a lei estabelece limites para proteger a dignidade e a subsistência mínima do devedor. Segundo o Código de Processo Civil (CPC), em seu artigo 833, alguns valores são, em regra, impenhoráveis. Os mais comuns são:

  • Salários, aposentadorias e pensões: Verbas de natureza alimentar, em geral, não podem ser penhoradas.
  • Poupança: Valores depositados em caderneta de poupança até o limite de 40 salários mínimos.

Contudo, existe uma exceção crucial: a regra da impenhorabilidade não se aplica para o pagamento de pensão alimentícia. O parágrafo 2º do mesmo artigo 833 do CPC é claro ao permitir a penhora de salários e outros rendimentos para quitar débitos alimentares.

Na prática, os tribunais têm autorizado o bloqueio de um percentual do salário do devedor (geralmente até 30% ou até o limite de 50% dos seus ganhos líquidos, somando as parcelas vencidas e as que estão por vencer), garantindo que tanto a obrigação com os filhos seja cumprida quanto a subsistência do próprio devedor seja minimamente preservada.

O Que Fazer Após o Bloqueio da Conta? O Prazo Para Defesa

Uma vez que os valores são tornados indisponíveis pelo SISBAJUD, o devedor é formalmente intimado, na pessoa de seu advogado (ou pessoalmente, caso não tenha um). A partir dessa intimação, inicia-se um prazo legal e muito curto, de apenas 5 dias, para que ele se manifeste, conforme o artigo 854, § 3º, do CPC.

Nesta manifestação, o devedor pode alegar:

  • Impenhorabilidade: Provar que os valores bloqueados são impenhoráveis (por exemplo, que o valor em conta poupança está abaixo do limite legal e não se destina à pensão).
  • Excesso de Bloqueio: Demonstrar que o valor bloqueado é muito superior ao da dívida executada.
  • Pagamento: Apresentar comprovantes de que a dívida já foi quitada.

É fundamental que o devedor procure imediatamente um advogado de sua confiança, pois a perda desse prazo pode resultar na conversão do bloqueio (indisponibilidade) em penhora, que é a etapa seguinte, onde o valor é efetivamente transferido da conta do devedor para uma conta judicial e, posteriormente, liberado para o credor.

Uma Ferramenta Essencial, Mas que Exige Atenção

O bloqueio de contas via SISBAJUD representa um avanço inegável na efetividade das execuções de alimentos, garantindo que o direito de quem mais precisa seja respeitado. A tecnologia permitiu que a Justiça agisse de forma rápida e precisa, combatendo manobras para evitar o pagamento da pensão.

Para o credor, essa ferramenta é a principal garantia de que a obrigação será cumprida. É essencial contar com um advogado diligente que saiba utilizar todos os recursos do sistema, incluindo a “teimosinha”, para localizar e assegurar os valores devidos.

Para o devedor, o bloqueio serve como um alerta final e contundente. Ignorar a obrigação alimentícia trará consequências financeiras severas e imediatas. Ao ser notificado de um processo ou ter a conta bloqueada, a ação mais prudente é buscar imediatamente assessoria jurídica para negociar o débito ou apresentar sua defesa dentro do prazo legal, evitando que a situação se agrave.

Em suma, o bloqueio de contas não é uma medida arbitrária, mas sim um procedimento legal bem estruturado, que busca equilibrar o direito do alimentando de receber seu sustento com o direito do devedor a uma defesa justa e à proteção de sua dignidade.

Priscila Casimiro Ribeiro Garcia

Advogada altamente qualificada, Pós Graduada em Execuções Cíveis pela OAB/SP. Especialista em Direito de Família, atuante na área há mais de 15 anos.

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