O luto é um processo complexo, repleto de desafios emocionais e, infelizmente, burocráticos. Em meio à dor da perda, os herdeiros são confrontados com uma responsabilidade legal imediata: a abertura do inventário. Este é o procedimento legal obrigatório para apurar os bens, direitos e dívidas do falecido, a fim de transferir formalmente a herança aos seus sucessores.
A lei brasileira, especificamente o Código de Processo Civil, estabelece um prazo claro para que essa obrigação seja cumprida. Contudo, seja pela complexidade emocional, pela falta de consenso entre os herdeiros ou simplesmente por desinformação, muitas famílias acabam perdendo esse prazo.
O que começa como um adiamento necessário para lidar com o luto, pode rapidamente se transformar em um problema financeiro e jurídico grave. Se você está se perguntando “o que acontece se eu não fizer o inventário dentro do prazo?”, este artigo é para você. A procrastinação, neste caso, tem custos reais que afetam diretamente o patrimônio deixado.
Entendendo os Prazos: O Que Exatamente Diz a Lei?
Para entender as consequências do atraso, primeiro precisamos definir os prazos. A legislação é direta:
- Prazo para Abertura: O Artigo 611 do Código de Processo Civil (CPC) estipula que o processo de inventário e partilha deve ser instaurado (aberto) dentro de 60 dias a contar da data do falecimento.
- Prazo para Conclusão: Uma vez aberto, o CPC sugere um prazo de 12 meses para sua conclusão, embora esse prazo possa ser estendido pelo juiz, especialmente em casos complexos.
O prazo mais crítico, e o que gera as penalidades mais imediatas, é o de 60 dias para a abertura. É o descumprimento deste prazo inicial que configura o inventário atrasado.
A Consequência Imediata e Mais Custosa: A Multa sobre o ITCMD
A penalidade mais tangível de perder o prazo é financeira. O inventário envolve o pagamento de um imposto estadual obrigatório: o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação).
É fundamental entender que a multa pelo atraso não é federal, mas sim estadual. Cada estado da federação tem autonomia para legislar sobre o ITCMD e suas penalidades.
Na prática, quase todos os estados impõem uma multa progressiva sobre o valor do imposto devido, caso o inventário não seja aberto no prazo de 60 dias.
- Como funciona a multa: A multa é um percentual aplicado sobre o valor do imposto que já seria pago. Por exemplo, se o imposto devido é de R$ 20.000,00, uma multa de 10% adicionaria R$ 2.000,00 à conta. Se o atraso for muito longo, alguns estados chegam a aplicar multas de 20% ou mais sobre o imposto, além dos juros de mora.
Portanto, o primeiro efeito do atraso é simples: a herança se tornará mais cara. É um dinheiro que deixa de ser dos herdeiros e vai para os cofres públicos, unicamente pela perda do prazo. Um advogado especialista pode analisar a legislação do seu estado para calcular o impacto exato, mas a regra é clara: o tempo, aqui, custa dinheiro.
O “Congelamento” dos Bens: A Impossibilidade de Vender ou Sacar
Se a multa financeira não fosse motivo suficiente, o atraso no inventário gera um problema prático devastador: o bloqueio total do patrimônio.
Enquanto o inventário não for concluído e o “Formal de Partilha” (em processos judiciais) ou a “Escritura Pública de Inventário” (em cartório) não for emitida, os herdeiros simplesmente não podem dispor dos bens.
Embora os herdeiros se tornem donos da herança no momento do falecimento (pelo princípio da Saisine), eles não podem exercer plenamente esse direito de propriedade.
Imóveis Ficam Irregulares e “Presos”
Você não pode vender, alugar formalmente ou dar como garantia um imóvel que ainda está em nome do falecido. O Registro de Imóveis exige o documento final do inventário para transferir a propriedade. Um imóvel “preso” em um inventário atrasado não pode ser negociado, perde valor de mercado e pode até gerar dívidas de condomínio e IPTU, que se acumulam.
Contas Bancárias e Investimentos Ficam Bloqueados
Assim que o banco é notificado do falecimento (o que acontece rapidamente, via cruzamento de dados), as contas do falecido são bloqueadas. Os herdeiros não podem sacar saldos, resgatar aplicações financeiras ou acessar investimentos sem uma ordem judicial (um alvará) ou a conclusão do inventário. Esse dinheiro fica, literalmente, inacessível, muitas vezes prejudicando o sustento da própria família.
Veículos Não Podem Ser Transferidos
Da mesma forma, não é possível vender ou transferir legalmente um veículo que pertencia ao falecido. O DETRAN exigirá a documentação do inventário para qualquer mudança de propriedade.
Outros Problemas Graves Gerados pelo Atraso
Infelizmente, os problemas não param no imposto e no bloqueio de bens. A inércia pode criar complicações jurídicas ainda mais sérias.
1. Risco de Usucapião por Outro Herdeiro
Este é um dos maiores riscos em atrasos longos. Imagine que um dos herdeiros permaneceu morando no único imóvel da herança por 10, 15 ou 20 anos, sem qualquer oposição dos demais. Se ele arcou com os custos do imóvel (IPTU, manutenção) e agiu como “dono” exclusivo, ele pode, eventualmente, entrar na justiça e pedir a usucapião daquele imóvel, excluindo os outros herdeiros da partilha daquele bem.
2. Deterioração do Patrimônio
Bens parados se deterioram. Imóveis podem ser invadidos ou se deteriorar pela falta de manutenção. Empresas que faziam parte da herança podem ir à falência sem gestão. O atraso no inventário significa falta de administração legal do patrimônio, levando à sua desvalorização.
3. Complicações Fiscais e Acúmulo de Dívidas
As obrigações fiscais do falecido não morrem com ele. A falta da “Declaração Final de Espólio” (a última declaração de Imposto de Renda) e a falta de pagamento de impostos dos bens (como IPTU e IPVA) transformam o CPF do falecido em “pendente de regularização” e geram dívidas que serão cobradas dos herdeiros com juros.
“Nunca Fiz o Inventário. E Agora?” – A Solução Existe
Se você está lendo este artigo e percebeu que seu prazo de 60 dias (ou até mesmo anos) já passou, respire fundo. A boa notícia é que sempre há uma solução.
O inventário deve ser feito, independentemente do tempo de atraso. Não existe um prazo limite após o qual “não se pode fazer mais”. O que existe é o acúmulo das penalidades que mencionamos.
O processo poderá ser feito de duas formas:
- Inventário Extrajudicial (em Cartório): É a via mais rápida, barata e simples. Exige que todos os herdeiros sejam maiores, capazes e estejam em total acordo. O atraso no prazo não impede o inventário em cartório, mas a multa do ITCMD será calculada e cobrada pelo tabelião.
- Inventário Judicial: É obrigatório se houver herdeiros menores de idade, incapazes, ou se os herdeiros estiverem em desacordo (litígio) sobre a partilha. Se o prazo foi perdido, o juiz será comunicado e a Fazenda Estadual será chamada ao processo para cobrar a multa devida.
Não Deixe o Problema Crescer
Deixar o inventário “para depois” é a pior estratégia possível. É uma decisão que não resolve o luto, mas garante que, quando os herdeiros finalmente decidirem agir, o processo será mais caro, mais lento e mais conflituoso.
O patrimônio deixado, muitas vezes fruto do trabalho de uma vida inteira do falecido, corre o risco de ser consumido por multas, juros e deterioração. Além disso, a falta de resolução formal é o principal combustível para conflitos familiares que podem destruir relacionamentos.
A regularização é inevitável. A única escolha é se ela será feita de forma estratégica e planejada, ou de forma reativa e emergencial, quando os problemas já se tornaram graves.
Se você está com um inventário atrasado, ou se o falecimento ocorreu recentemente e você quer evitar todas essas complicações, o primeiro passo é buscar orientação especializada.
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