A gestão de um imóvel alugado envolve uma série de responsabilidades e, sem dúvida, uma das questões mais sensíveis é o valor do aluguel. Para muitos proprietários, surge uma dúvida crucial, especialmente em um mercado imobiliário dinâmico: o valor que cobro hoje ainda é justo? E isso leva diretamente à pergunta que recebemos com frequência aqui no escritório: posso aumentar o valor do aluguel fora da data de reajuste anual prevista em contrato?
A resposta curta é: depende, e com regras muito claras. A legislação brasileira, em especial a Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/91), preza pela estabilidade e segurança jurídica dos contratos. Por isso, a ideia de um aumento repentino e unilateral por parte do locador é, em regra, vedada.
No entanto, existem situações específicas em que essa alteração é possível, mas é fundamental entender a diferença entre reajuste e revisão do aluguel. Como especialistas em direito imobiliário, vamos detalhar o que a lei permite, quais os caminhos a seguir e como garantir que seus direitos como proprietário sejam exercidos de forma correta e segura, evitando problemas futuros.
O Básico: Entendendo o Reajuste Anual
Antes de mais nada, é preciso consolidar o conceito mais comum: o reajuste anual do aluguel. Este é o aumento previsto em contrato, que ocorre, via de regra, a cada 12 meses de vigência do acordo.
Esse reajuste não é um aumento aleatório ou baseado na “vontade” do proprietário. Ele está atrelado a um índice de inflação, que deve estar expressamente indicado no contrato de locação. Os mais comuns são:
- IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado): Por muitos anos, foi o índice mais utilizado em contratos de aluguel.
- IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo): Tem ganhado cada vez mais espaço por refletir de forma mais direta a inflação ao consumidor.
Portanto, realizar esse reajuste anual não é apenas um direito, mas uma prática padrão para corrigir o valor do aluguel frente à desvalorização da moeda. A aplicação é simples: calcula-se o percentual acumulado do índice nos últimos 12 meses e aplica-se sobre o valor vigente do aluguel. Este é o único aumento que pode ser feito de forma automática, anualmente, conforme o contrato.
A Exceção à Regra: A Ação Revisional de Aluguel
Agora, vamos à questão central. E se o valor do aluguel, mesmo com o reajuste anual, ficou extremamente defasado em relação aos imóveis vizinhos e à realidade do mercado? Imagine que a região onde seu imóvel está localizado sofreu uma valorização expressiva por conta de uma nova estação de metrô ou um novo parque. Nesse cenário, a Lei do Inquilinato prevê um mecanismo específico: a ação revisional de aluguel.
Diferente do reajuste (que é automático e baseado na inflação), a revisão tem como objetivo adequar o aluguel ao valor de mercado atual do imóvel. Contudo, ela não pode ser solicitada a qualquer momento. A lei estabelece dois requisitos cumulativos e indispensáveis:
- Prazo Mínimo de Contrato: A ação revisional só pode ser proposta após três anos de vigência do contrato de locação ou do último acordo de alteração de valor.
- Defasagem Comprovada: Não basta o proprietário “achar” que o aluguel está baixo. É preciso comprovar, de forma robusta, que há uma discrepância significativa entre o valor pago pelo inquilino e o preço praticado pelo mercado para imóveis semelhantes na mesma região.
A ação revisional, como o nome sugere, é um processo judicial. Nela, o juiz nomeará um perito para avaliar o imóvel e a região, determinando qual seria o “aluguel justo” de mercado. O novo valor fixado pelo juiz passará a valer a partir da citação do inquilino no processo.
O Melhor Caminho: O Acordo Amigável Entre as Partes
Apesar de a ação revisional ser um direito, a via judicial deve ser sempre o último recurso. Ela envolve custos com advogado, taxas judiciárias, honorários periciais e, claro, o tempo e o desgaste de um processo.
Por isso, antes de pensar em litígio, a melhor alternativa é sempre tentar uma negociação amigável com o inquilino. O bom senso e uma conversa transparente podem levar a um acordo que seja benéfico para ambos.
O proprietário pode, por exemplo, apresentar uma pesquisa de mercado, mostrando anúncios de imóveis similares na região para embasar seu pedido de revisão amigável. Se o inquilino concordar com o novo valor, é imprescindível que essa alteração seja formalizada por meio de um aditivo contratual. Esse documento, assinado por ambas as partes, passará a fazer parte do contrato de locação original e garantirá a segurança jurídica do acordo.
É importante notar que, a partir da data desse acordo, o prazo de três anos para uma nova ação revisional começa a contar novamente.
Mitos Comuns: “Fiz Benfeitorias, Posso Aumentar o Aluguel?”
Essa é outra dúvida comum. Muitos proprietários acreditam que, ao realizar melhorias no imóvel (como instalar armários planejados, reformar o banheiro ou trocar o piso), podem automaticamente aumentar o aluguel. Isso é um mito!
As benfeitorias úteis ou necessárias realizadas pelo locador no imóvel durante a vigência do contrato não dão o direito de exigir um aumento imediato do aluguel, a menos que isso tenha sido previamente acordado com o inquilino. A valorização decorrente dessas melhorias poderá, sim, ser um forte argumento para a negociação de um novo valor no momento da renovação do contrato ou como base para uma futura ação revisional, desde que cumprido o requisito dos três anos.
Conclusão: Planejamento e Diálogo São a Chave
Em resumo, a regra geral é clara: o aumento do aluguel deve seguir o reajuste anual previsto em contrato.
Aumentar o valor fora dessa data só é possível em duas hipóteses:
- Acordo Mútuo: Através de uma negociação transparente com o inquilino, formalizada por um aditivo contratual. Este é sempre o caminho preferencial.
- Ação Revisional de Aluguel: Por meio de um processo judicial, desde que o contrato tenha no mínimo três anos de vigência e seja comprovada uma defasagem significativa em relação ao valor de mercado.
Ignorar essas regras e tentar impor um aumento unilateralmente é uma prática ilegal que pode gerar a rescisão do contrato por culpa do locador, além de eventuais ações por cobrança indevida.
Portanto, se você é proprietário e sente que seu aluguel está defasado, o primeiro passo é pesquisar o mercado. O segundo, e mais importante, é buscar o diálogo com o inquilino. Caso a conversa não avance e os requisitos legais para uma revisão sejam atendidos, contar com uma assessoria jurídica especializada é fundamental para garantir que o processo seja conduzido da maneira correta, protegendo seus direitos e seu patrimônio.