Venda por Consignação: Direitos e Deveres do Proprietário e da Concessionária

Venda por Consignação: Direitos e Deveres do Proprietário e da Concessionária

A venda por consignação é uma modalidade comercial bastante comum, especialmente no setor automotivo, mas também presente em diversos outros mercados, como o de vestuário, joias e até mesmo obras de arte. Embora traga flexibilidade para ambas as partes, é crucial entender os direitos e deveres do proprietário (consignante) e da concessionária ou intermediário (consignatário) para evitar dores de cabeça e litígios.

Se você é um proprietário pensando em deixar seu bem em consignação, ou uma concessionária que opera nesse modelo, este artigo é para você. Desvendaremos os aspectos jurídicos dessa relação, garantindo que suas transações sejam seguras e transparentes.

O Que é, Afinal, a Venda por Consignação?

Em termos simples, a venda por consignação ocorre quando o proprietário de um bem (o consignante) entrega esse bem a um terceiro (a concessionária, loja, ou intermediário – o consignatário) para que este o venda em seu nome. O consignatário não adquire a propriedade do bem no momento da entrega; ele apenas detém a posse para fins de exposição e venda. A transferência da propriedade só ocorre quando o bem é vendido ao consumidor final.

Nesse arranjo, a concessionária geralmente recebe uma comissão ou um valor predefinido pela venda, enquanto o proprietário recebe o valor acordado pelo seu bem. É uma dinâmica que pode ser vantajosa, pois o proprietário evita o trabalho de vender diretamente, e a concessionária amplia seu estoque sem a necessidade de grande capital de giro.

Os Direitos Inegociáveis do Proprietário (Consignante)

Ao entregar seu bem em consignação, você, como proprietário, possui uma série de direitos que devem ser resguardados. Conhecê-los é o primeiro passo para uma transação segura.

Primeiramente, você tem o direito à informação clara e precisa. Isso significa que o contrato de consignação deve detalhar as condições da venda, o valor mínimo a ser recebido, a comissão da concessionária, o prazo da consignação e as responsabilidades de ambas as partes. Qualquer cláusula ambígua ou que dificulte seu entendimento deve ser questionada.

Além disso, o proprietário detém o direito de reaver o bem caso a venda não se concretize dentro do prazo estipulado no contrato. Se a concessionária não conseguir vender o bem, ou se houver um desacordo, o proprietário pode solicitar a devolução do seu patrimônio. É fundamental que o contrato estabeleça um prazo razoável para a consignação e as condições para a devolução.

Outro ponto crucial é o direito ao recebimento do valor acordado. Uma vez que o bem seja vendido, a concessionária tem o dever de repassar o valor combinado ao proprietário, descontada a comissão, dentro do prazo estipulado. Atrasos ou a retenção indevida de valores configuram infração contratual e podem gerar responsabilização.

Importante ressaltar que o proprietário mantém a propriedade do bem até a sua efetiva venda. Isso significa que, em caso de qualquer incidente (roubo, dano, etc.) enquanto o bem estiver sob a posse da concessionária, a responsabilidade pode recair sobre ela, dependendo das cláusulas contratuais e da comprovação de culpa ou dolo. Portanto, verifique se o contrato prevê a responsabilidade da concessionária pela guarda e conservação do bem.

Por fim, você tem o direito de fiscalizar e acompanhar a exposição e as tentativas de venda do seu bem. Embora a concessionária tenha a posse, a propriedade continua sendo sua, o que lhe confere o direito de verificar como seu bem está sendo cuidado e apresentado aos potenciais compradores.

Os Deveres Essenciais do Proprietário (Consignante)

Se, por um lado, o proprietário possui direitos, por outro, também recaem sobre ele deveres inegáveis para o bom andamento da relação de consignação.

O primeiro e mais fundamental dever é a entrega do bem em condições adequadas para a venda. Isso implica que o bem deve estar em conformidade com o que foi acordado com a concessionária, livre de vícios ocultos que possam comprometer a transação ou gerar problemas futuros para o comprador final. Por exemplo, no caso de um veículo, a documentação deve estar em dia e o carro em bom estado de conservação, conforme o que foi informado.

Outro dever importante é a apresentação de toda a documentação necessária. Para veículos, por exemplo, é imprescindível entregar o Certificado de Registro e Licenciamento do Veículo (CRLV) e o Certificado de Registro do Veículo (CRV) em dia, além de quaisquer outros documentos que comprovem a propriedade e a regularidade do bem. A falta de documentação pode inviabilizar a venda e gerar atrasos e frustrações para a concessionária.

É igualmente crucial o dever de manter a boa-fé e a transparência. Isso significa não omitir informações relevantes sobre o bem, como histórico de acidentes, pendências financeiras ou qualquer outro fato que possa influenciar a decisão de compra ou a responsabilidade da concessionária. A honestidade desde o início evita problemas e fortalece a relação.

Por fim, o proprietário tem o dever de cumprir as obrigações contratuais, como o prazo de retirada do bem caso a venda não se concretize e o pagamento de eventuais taxas ou despesas acordadas em contrato.

Os Direitos da Concessionária (Consignatária)

A concessionária, ao aceitar o bem em consignação, também adquire direitos importantes que garantem a viabilidade de sua operação e a segurança jurídica.

A concessionária tem o direito de receber a comissão ou o valor acordado pela venda. Esse é o principal benefício para a concessionária e deve estar claramente definido no contrato. O valor da comissão ou o percentual sobre a venda deve ser transparente e previamente aceito pelo proprietário.

Outro direito fundamental é o direito à exclusividade da venda durante o período da consignação, se assim estiver previsto em contrato. Isso impede que o proprietário tente vender o bem por conta própria ou através de outra intermediária, o que poderia prejudicar os esforços de venda da concessionária.

A concessionária também tem o direito de ser informada sobre qualquer vício ou problema no bem. Se o proprietário omitir informações relevantes que afetem a venda ou a reputação da concessionária, ela tem o direito de ser ressarcida por eventuais prejuízos.

Os Deveres Cruciais da Concessionária (Consignatária)

Recaem sobre a concessionária uma série de deveres que são a base para uma relação de consignação ética e legal.

Primeiramente, o dever de guardar e conservar o bem com zelo. A concessionária é responsável pela integridade do bem enquanto ele estiver sob sua posse. Isso inclui protegê-lo contra danos, roubos e quaisquer outras ocorrências que possam desvalorizá-lo. É fundamental que a concessionária tenha seguros adequados para cobrir esses riscos.

Em segundo lugar, a concessionária tem o dever de envidar seus melhores esforços para a venda do bem. Isso significa divulgá-lo adequadamente, apresentá-lo a potenciais compradores e negociar de forma diligente para concretizar a venda. A inércia ou a falta de empenho podem configurar descumprimento contratual.

A transparência na prestação de contas é outro dever inegociável. A concessionária deve informar ao proprietário sobre o andamento das negociações, os valores propostos e, após a venda, apresentar um extrato detalhado com o valor da venda, a comissão e o valor a ser repassado ao proprietário.

O dever de repassar o valor da venda ao proprietário no prazo acordado é crucial. A retenção indevida de valores configura apropriação indébita e pode gerar graves consequências jurídicas para a concessionária.

Por fim, a concessionária tem o dever de informar ao proprietário sobre qualquer proposta de compra que esteja abaixo do valor mínimo estabelecido. Em alguns casos, pode ser interessante para o proprietário aceitar uma oferta menor para concretizar a venda, e essa decisão deve ser sempre dele.

A Importância de um Contrato Sólido na Venda por Consignação

Como ficou claro, a venda por consignação envolve uma complexidade de direitos e deveres. Para mitigar riscos e garantir a segurança jurídica de ambas as partes, a elaboração de um contrato de consignação sólido e detalhado é indispensável.

Este contrato deve abordar, entre outros pontos:

  • A identificação completa das partes;
  • A descrição detalhada do bem em consignação;
  • O valor mínimo para a venda do bem;
  • O valor da comissão da concessionária e a forma de pagamento;
  • O prazo da consignação e as condições para sua prorrogação ou encerramento;
  • As responsabilidades de cada parte pela guarda e conservação do bem;
  • As condições para a devolução do bem caso a venda não se concretize;
  • A forma de prestação de contas da concessionária;
  • As condições para rescisão do contrato e as penalidades em caso de descumprimento;
  • A eleição de foro para dirimir eventuais litígios.

Buscar assessoria jurídica especializada antes de assinar qualquer contrato de consignação é, portanto, uma medida preventiva inteligente. Um advogado poderá analisar as cláusulas, apontar riscos e garantir que seus interesses estejam protegidos, seja você o proprietário ou a concessionária.

Negocie com Conhecimento e Segurança

A venda por consignação pode ser uma ferramenta poderosa para agilizar transações e otimizar processos comerciais. No entanto, o sucesso dessa modalidade depende diretamente do conhecimento dos direitos e deveres de cada parte e, crucialmente, da existência de um contrato bem elaborado.

Proprietários, estejam atentos aos seus direitos de informação, recebimento e reaver o bem, e cumpram seus deveres de transparência e entrega de documentação. Concessionárias, exerçam seus direitos à comissão e exclusividade, e cumpram seus deveres de guarda, esforço de venda e prestação de contas.

Ao entender e respeitar esses princípios, tanto proprietários quanto concessionárias podem usufruir dos benefícios da consignação, evitando litígios e construindo relações comerciais duradouras e transparentes. Em caso de dúvidas ou necessidade de elaborar um contrato, não hesite em entrar em contato conosco! Seu patrimônio e sua tranquilidade valem o investimento!

Priscila Casimiro Ribeiro Garcia

Advogada altamente qualificada, Pós Graduada em Execuções Cíveis pela OAB/SP. Especialista em Direito de Família, atuante na área há mais de 15 anos.

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